Stan Laurel: Memórias de um Garoto de Ulverston

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O ator que teria sido enganado por Chaplin, se tornaria grande por seus próprios méritos, e conhecido pela dupla que faria ao lado de Oliver Hardy.

 

Stan Laurel nasceu em Ulverston (Inglaterra) em 16 de junho de 1890. Era o segundo de uma família de cinco filhos de Arthur e Margaret Jefferson, proprietários de um teatro. O futuro ator foi criado com seus avós até os seis anos, antes de começar seus estudos, completando sua educação em Glasgow.

 Seu primeiro trabalho no teatro foi no escritório de seu pai, no Teatro Metropole, mas o garoto de dezesseis anos tinha outros planos em mente. Nesse período conheceu Albert E. Pickard, homem que lhe deu a primeira chance no teatro Britannia Panopticon, em Glasgow, Escócia. Na platéia estava seu pai, que no primeiro momento não aprovava a escolha do filho e preferia que o rapaz gerenciasse seu teatro.
Stan com sua mãe em frente à sua casa em Ulverston, Inglaterra

Por volta de 1907 Stan começou a excursionar em uma série de grupos teatrais ganhando uma libra por semana. Em 1910 entrou para a companhia de Fred Karno como eventual substituto de Charles Chaplin, que naquele momento tinha grande destaque na trupe. Das enquetes que chegou a participar estava “Mumming Bird”.

Neste ano ele pode viajar com o grupo para a América, onde o ator começou a preparar seus próprios números. Na época ele usava o nome de Stan Jefferson, mas decidiu mudar seu sobrenome para Laurel depois de conversar com Mae Dahlberg, por questões supersticiosas: acontece que Stan Jefferson tinha treze letras, e para ele isso atraia má sorte.
A Trupe de Karno chega à América. Stan é o primeiro sentado à esquerda. Chaplin está com uma bóia na cabeça

Controvérsia com Charles Chaplin

A relação de Chaplin e Stan é um capítulo à parte na vida de ambos. Os dois tinham um sentimento ambíguo um com o outro, e Stan se sentia injustiçado e uma vítima do ator que criou Carlitos. O ator confidenciou para sua esposa Virgínia que Stan ensaiava um número que iria apresentar no dia seguinte. Chaplin secretamente anotou todos os seus trejeitos e no dia seguinte os apresentou durante uma exibição. Stan ficou surpreso com aquele personagem que tinha os mesmos trejeitos de Jimmy, personagem criado por ele. Stan foi demitido da companhia e tempos depois Chaplin foi contratado por Mack Sennett, que ouvira falar de seu personagem nos palcos.

Chaplin e Stan na América, 1910

Curiosamente, Chaplin não cita Stan uma só vez em sua autobiografia, e da última vez que se encontraram, prometeu um papel para ele em uma de suas películas, mas o projeto jamais foi para o papel. Também prometeu ajuda-lo financeiramente, quando Stan estava mal das finanças, e isso, naturalmente nunca ocorreu.

Mas Stan estava destinado também ao cinema. Em 1917 Stan ele atuou em Nuts in May, primeira de uma série de participações em filmes que ele fez para a Universal. Porém, seu contrato não foi renovado, e ele retornou aos palcos. O ator escreveu alguns roteiros para o estúdio de Hal Roach e por volta de 1920 já tinha rodado cerca de 50 curtas quando conheceria o homem que mudaria sua vida.

O Parceiro de uma vida: Oliver Hardy

O ator que se tornaria conhecido como o gordo da dupla Oliver & Hardy nasceu na Georgia em 18 de janeiro de 1892. Perdeu seu pai antes de completar um ano de idade e aos oito fugira de casa para se juntar a um grupo de menestréis. Logo era devolvido para a família, mas aquela experiência jamais sairia de sua cabeça, fazendo com que ele guardasse todo dinheiro que ganhava para assistir a espetáculos.

Após fugir de uma escola militar, decidiu não terminar os estudos e tentar estudar canto. E assim conseguiu seu primeiro emprego, cantando por cinquenta centavos. Em 1910 Olie mudou-se para Jacksonville, onde sabia que encontraria vários cineastas que poderiam lhe dar uma chance. E assim aconteceu: eles precisavam de um ator gordinho para um filme, e Olie era ideal. Sua estréia foi com o fime Outwitting Dad (1913). Trabalhando com Hal Roach, adicionou Oliver ao seu nome e por volta desse período conheceu Stan Laurel quando trabalharam juntos em Lucky Dog (1917).
Olie em seu primeiro filme
Os parceiros trabalharam juntos em outros dez curtas antes de se tornar uma dupla de fato. Foi quando Hal Roach percebeu que a diferença corporal entre os dois favorecia uma dupla de opostos. Slipping Wives (1927) marcaria o início de fato da dupla, que começava a atrair olhares.
Surgia O Gordo e o Magro, que além de físicos diferentes, possuíam também personalidades igualmente distintas. Enquanto o magro tinha uma personalidade frágil, camarada e bem intencionado, o gordo era impaciente e apresentava uma exuberância refinada. A amizade cresceu em igual tamanho enquanto formavam a dupla de maior sucesso no cinema. Dentre alguns dos sucessos da dupla estão Caixa de Música (1932) e Era uma Vez Dois Valentes (1934).
Hal Roach com sua dupla

A dupla atravessou o período complicado que foi a chegada dos filmes falados. Outros comediantes dessa época também teriam problemas em se adaptar, como Harold Lloyd, Charles Chaplin e Buster Keaton. E embora muitos críticos considerem o período mudo da carreira de ambos melhor em relação ao futuro incerto dos filmes falados, eles conseguiram manter certa hegemonia neste período.

Na década de 30 Stan brigou com Roach, e os atores decidiram criar sua própria companhia, a Laurel and Hardy Feature Productions. Não chegaram a realizar filmes, mas excursionavam pelo país. A dupla iria trabalhar para vários estúdios diferentes, dentre elas a 20th Century Fox, MGM e Atoll. A década de 40 traria um futuro incerto para todos, com a eclosão da segunda guerra, e muitos de seus filmes passaram a perder apoio do público. Os seus salários, porém, diminuíram com o tempo e apesar de Stan receber um pouco mais do que Oliver (Stan na verdade escrevia a maior parte de seus números), era difícil manter o controle sobre suas obras. A verdade é que, assim como Buster Keaton, eles eram empregados dos estúdios, não tendo direitos sobre suas obras.

A remissão viria somente com a chegada da TV, quando seus antigos filmes passaram a ser exibidos em horário nobre. Apesar disso, eles não recebiam direitos, já que a maior parte tinha caído em domínio público. Tanto Stan quanto Oliver não conseguiram enriquecer graças ao dinheiro ganho, e a tentativa de Hal Roach de uni-los em 1951 caiu por terra por causa da saúde fragilizada da dupla. Ele tencionava realizar uma série para televisão chamada Laurel and Hardy’s Fabulous Fables, mas o projeto não saiu do papel. Foram 106 filmes juntos, dos quais 32 curta-metragens, 23 longas, 11 como convidados e 40 curtas sonoros.

Algumas fotos da dupla

Casamentos

O primeiro amor do ator que chegou na América em 1910 foi Mae Dahlberg, atriz do primeiro filme em que ele atuou. Os dois viveram juntos entre 1919 e 1925 mas nunca chegaram a oficializar a relação apesar de em alguns filmes ela ser creditada como Mae Laurel. Os problemas entre o casal começaram quando ele decidiu dedicar-se somente ao cinema e no seu contrato havia uma cláusula que a proibia de aparecer em qualquer dos filmes dele. Isso aconteceu porque Hal Roach achava que Mae influenciava de maneira negativa a carreira de Stan, fazendo com que ele não alcançasse o sucesso. O casal se separou quando ela aceitou uma proposta de Roach para que fosse morar na Austrália.

Mae e Stan

Lois Nielson era uma atriz de cinema e Laurel já a conhecia da época em que atuaram juntos em “Do You Love Your Wife?” (1919). Os dois já moravam juntos em 1925, pouco tempo depois dele se separar de Mae Dahlberg, e se casaram em 13 de agosto de 1926. O casal teve dois filhos, Lois (1927) e Robert, que viveu apenas dois nove dias. Os dois se separaram em 1930.

Stan e Lois

Stan voltaria a se casar, desta vez com Virginia Ruth Rogers. Os dois se conheceram durante uma excursão a Ilha de Catalina em 1933. Embora já estivesse separado de Lois desde 1930, o divórcio só sairia em 1934. Ao contrário do que tinha ocorrido em seus relacionamentos anteriores, desta vez Stan só passou a morar na mesma casa que a esposa após oficializar a união em 1935. Virginia, que também era atriz, era uma loura muito bonita e tinha um senso de humor maravilhoso. Os dois inicialmente foram muito felizes, mas o temperamento de Stan fez com que o relacionamento começasse a decair em pouco tempo. O casal se divorciou em 1938 quando o ator a deixou para se casar com a russa Vera Ivanova Shuvalova.

Com Virginia

O relacionamento com Vera foi tempestuoso desde o início, envolvendo brigas, discussões e um processo de divórcio que abalou a todos os envolvidos. Vera tinha 28 anos e Stan, 43. Nem bem assinou o divórcio com Virginia, Stan viajou com sua nova amada para Yuma. Os jornais estampavam brigas e confusões em que os dois se metiam, tanto juntos quanto separados. Em 1941 Stan voltou para os braços de Virginia, para novamente se divorciar dela em 1946.

Com Vera
Ida Kitaeva Raphael seria sua última esposa, e segundo pessoas que conviveram com eles, seu mais estável. Ela esteve ao seu lado entre 1946, quando se casaram, até a morte do ator.
Com Ida

Últimos Tempos

1954 não foi um bom ano para a dupla. Oliver Hardy sofreu um infarto nesse período, e não recuperou a saúde desde então. Os dois amigos se encontraram pela última vez em Reseda, na casa de de Lois, filha de Stan, em 1956. Este vídeo mostra o último encontro:

Neste mesmo ano ele sofreu um ataque cardíaco. Decidindo cuidar mais da saúde, fez regime e chegou a emagrecer muitos quilos, mudando totalmente sua aparência. Porém, logo foi diagnosticado com câncer, falecendo em 7 de agosto de 1957 aos 65 anos. Stan ficou tão abalado com a notícia que não conseguiu comparecer ao funeral do amigo. Também não conseguiu mais trabalhar após isso, falava que estar em um estúdio sem Olie era muito dificil. O fato é que ele se sentiu muito perdido após o acontecimento e em cartas trocadas com seu primo Nellie Bushby, ele descreve a terrível perda:


“Eu sinto terrivelmente a falta dele e me sinto perdido. Ele sofreu muito nas últimas semanas por causa do câncer, e eu sinto que foi uma benção ele ter sido levado e se livrado de sua miséria e dor. Um triste fim para uma carreira maravilhosa. Deus o abençoe”. 

Em 1954 Stan sofreu um AVC e ficou de cama por vários meses. Em 1962 novos problemas de saúde com uma hemorragia no olho esquerdo que o deixou cego durante um bom tempo. No final de 1964 o ator foi detectado com câncer, mas acabou morrendo em decorrência de um ataque cardíaco em 23 de fevereiro de 1965.

Os últimos tempos de Laurel foram em seu apartamento no Oceana Hotel, em Santa Mônica. Dentre os amigos que o visitavam estava Jerry Lewis, que lhe homenageou no filme The Bellboy (1960). Tinha 84 anos. O veterano ator foi enterrado no cemitério Forest Lawn Hollywood Hills, em Los Angeles. Dentre os presentes estavam Buster Keaton, Hal Roach, Joe Rock, Leo McCarey e Dick Van Dyke. Abaixo, um vídeo de Bill Richmond (caracterizado como Stan) ao lado de Jerry Lewis, um grande fã:

Stan Laurel permanece no coração de todos os seus fãs, e embora não tenha sido justiçado em vários casos, entendemos que a vida nem sempre segue o rumo que queremos. As oportunidades dadas foram acolhidas, e o ator demonstrou ser um dos maiores gênios do cinema, recebendo um Oscar honorário em 1961. Obrigada, Stan.

Livro: Laurel & Hardy: A Bio-bibliography ( Wes D. Gehring)

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