Olivia de Havilland chega finalmente aos 100 anos. A inesquecível Melanie de E o Vento Levou carrega uma história rica de amores, fama e paixão pela vida.
Enquanto todas as atrizes buscavam freneticamente o papel de Scarlett O’Hara de E o Vento Levou, Olivia de Havilland era escolhida para interpretar Melanie, a doce e invejada amiga da protagonista. A meiguice emprestada por Olivia tornou sua personagem inesquecível, dentro de um elenco que se tornou icônico. Passadas décadas desde a estréia do filme, apenas Olivia e Mickey Kuhn (que na época tinha 7 anos) permanecem vivos.
É curioso que uma das maiores atrizes americanas tenha nascido em Tóquio em 1 de julho de 1916. Sua mãe, Lilian Fontaine, também era atriz, e sua irmã mais nova, Joan, também seguiria seus passos. O relacionamento entre as duas sempre foi conturbado, como tratamos na matéria em que falamos sobre ambas, e a melhor solução foi mesmo a separação após tantos embates. A imprensa, ávida pela história das irmãs vencedoras do Oscar dificilmente as deixaria esquecer das visgas que possuíam.
Olivia mudou-se com a família ainda criança para a Califórnia. Quando participava de uma peça na faculdade, foi vista por Max Reinhardt. Impressionado com a jovem ele a chamou para participar de “Sonho de uma Noite de Verão” (1935). A atuação de Olivia lhe rendeu um contrato de sete anos com a Warner.
Em 1934 Olivia conheceria o seu par mais constante da primeira fase de sua carreira. Com O Capitão Blood (1935) ela iniciaria uma parceria sólida com Errol Flynn. Foram oito filmes entre 1935 e 1941 e a química entre os dois era visível em tela. Depois de negar durante anos sobre um possível romance entre os dois, ela falou finalmente sobre o relacionamento que tinha com o ator, afirmando que não gosta de falar sobre o assunto, sobretudo por causa da fama de mulherengo que Errol tinha, mas reconhece que se sentia atraída por ele, e que chegaram a se apaixonar. Porém, o casamento dele com a atriz Lili Damita impediu que o romance fosse longe.
A dupla se reencontraria mais tarde na França, dois anos antes da morte dele em 1959. A princípio ela não o reconhecera, pois anos de bebida o fizeram envelhecer precocemente. Mas aquele olhar permanecia o mesmo da época em que atuaram juntos. Flynn morreu de um ataque cardíaco aos 50 anos, se tornando inesquecível nos filmes de capa e espada.
Sua interpretação da doce Melanie em E o Vento Levou marcaria sua carreira de forma significativa e por ela seria indicada ao seu primeiro Oscar de atriz coadjuvante. Não ganhou, mas a marca impressa de sua personagem a alçaria ao patamar de uma das atrizes mais completas de sua época.
Olivia tinha lido o romance de Margaret Mitchell, mas não se identificava com Melanie. Tampouco tinha ficado impressionada com a história. Foi somente após ler o roteiro adaptado que ela se apaixonou, pois nele Melanie parecia uma personagem mais real, totalmente diferente. A explicação está no fato de no livro essa personagem ser apresentada ao leitor sob a visão pessoal de Scarlett, personagem principal, e que criava uma imagem negativa dela.
E de fato em 1941 Olivia foi indicada mais uma vez, desta vez pelo romance/suspense A Porta de Ouro. Falei um pouco mais sobre a concepção do filme aqui nesse link. Curiosamente, ela perderia o prêmio para sua irmã, Joan Fontaine, que naquele ano se destacava com sua personagem Lina McLaidlaw Aysgarth em Suspeita, filme de Alfred Hitchcock. Brigadas nessa época, Joan negou o cumprimento da irmã.
Assim como tantos profissionais daquela época, Olivia começava a se incomodar com as ofertas oferecidas a ela. Bette Davis chegou a ser suspensa por causa desse sistema dos estúdios e Cary Grant passou a trabalhar sem contrato a maior parte de sua vida. Recusando papéis, Olivia também entrava nessa briga e impondo-se, começou a receber melhores papéis. Foi com a personagem Jody, uma mulher que é obrigada a dar seu filho para a adoção em “Só Resta uma Lágrima” que ela finalmente recebeu seu primeiro Oscar.
Tarde Demais (1950) trazia a história da herdeira Catherine Sloper, uma jovem oprimida por seu pai, que não consegue se adaptar à sociedade mas que, porém, poderá se tornar uma algoz por ter sido imensamente ferida. O filme trouxe para a atriz o seu segundo prêmio da Academia.
Ter recebido prêmios dos colegas e da crítica não a fez mudar sua linha de raciocínio, e sua visão sobre Hollywood se tornava cada vez mais amarga. A atriz estava visivelmente decepcionada com Hollywood, e a competição com sua irmã Joan Fontaine também contribuia para sua decisão. Desejava morar em um país que emanava cultura, e a França foi a melhor opção. Em 1955 Olivia decidiu mudar-se definitivamente para Paris com seu segundo marido.
Em 1965 se tornou a primeira mulher a dirigir o júri do Festival de Cannes. A atriz recebeu a Legião de Honra em 2010 das mãos do presidente Nicolas Sarkozy que estava visivelmente emocionado em estar na presença de “Melanie”. Em Paris ela fez muitos amigos e manteve os que fizera na América. Bette Davis e Ida Lupino estavam entre suas melhores.
Uma Vida Discreta
Olivia chegou a se apaixonar por Howard Hugles por volta de 1939. O produtor, porém, não se empolgou com a atriz, e nesse período estava envolvido com Katharine Hepburn. Devido à sua proximidade com ele, porém, a atriz desenvolveu a paixão pela aviação. Dentre seus romances, estão o que teve com o diretor John Huston.
Dentre suas melhores amigas no meio estava Bette Davis, que ela considerava a segunda maior estrela. A primeira, claro, era Greta Garbo. As duas estiveram juntas em quatro filmes. sendo o último Hush … Hush, Sweet Charlotte, de 1964.
Rodeada de artistas, Olivia se casou duas vezes, com dois escritores. A primeira em 1946, com Marcus Goodrich. Os dois tiveram um filho, Benjamin (1949 – 1991) e se separaram em 1952. O segundo, com Pierre Galante, que ela conheceu durante sua viagem a Paris onde participaria do Festival de Cannes. Devido as regras de divórcio, o casal só iria oficializar a relação em 1955 e no ano seguinte nasceria sua filha Gisele. O casal se divorciaria em 1979.
Encerrando um capítulo sobre a antiga discussão entre as duas irmãs, Joan falou em uma entrevista que se casou antes de Olivia, teve um filho antes dela, recebeu um Oscar e que se morresse antes sua irmã também ficaria furiosa por ela até nisso chegar antes. E de fato Joan faleceu aos 96 anos. Olivia, porém, ficou tremendamente triste com a morte de sua irmã mais nova em dezembro de 2013.
Bastante reservada quanto a sua vida privada, Olivia geralmente não gosta de homenagens. A atriz que se despediu das telas em 1988 com o televisivo The Woman He Loved se aposentou e aparece esporadicamente em alguns eventos e programas para TV. Apesar de viver sozinha com seus cuidadores, gasta bom tempo de seu dia conversando com sua filha Gisele, que vive na América. Assiste a poucos filmes atuais, e dedica-se a escrever suas memórias desde 2003. Olivia sente-se empolgada com a ideia de completar 100 anos, o que considera uma grande conquista. E é, para ela, e para nós. Uma atriz com uma bela história de vida, que viveu seus amores plenamente, foi amada e amou, e odiou em igual intensidade. Seu nome está inscrito na história do cinema que ajudou a propagar e tê-la entre nós é uma imensa honra. Viva, Olivia, você já é uma imortal.
Alguns de seus grandes momentos, dentro e fora das telas:
Fontes:
http://www.vanityfair.com/hollywood/2016/04/olivia-de-havilland-joan-fontaine-sibling-rivalry
http://www.ew.com/article/2015/01/29/olivie-de-havilland-gone-with-the-wind
http://www.independent.co.uk/arts-entertainment/films/features/sibling-rivalry-hollywoods-oldest-feud-828301.html