Audrey Hepburn – Da Guerra à Paz

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De infância difícil, saída dos becos da II Guerra Mundial, onde chegou a passar fome e trabalhou como voluntária, a atriz tinha mais dois irmãos. O pai seguiu o nazismo, deixando a família em dificuldades de toda sorte. Audrey e os irmãos foram mandados para a casa da avó, na Holanda, e adotou um nome inglês, para que não houvesse perigo de ser encontrada.

O balé tornou-se seu refúgio enquanto a comida era confiscada pelo governo e as pessoas passavam fome. O resultado disto na garota foi uma desnutrição, anemia e a depressão. Seu irmão foi para o campo de concentração durante algum tempo. Futuramente, seria oferecido a Audrey o papel de Anne Frank no cinema, mas a atriz se recusou a viver aquilo que tinha sentido na pele tão perfeitamente durante sua infância e adolescência. Seria por demais reviver mais uma vez a dor. “Enquanto lia O Diário de Anne Frank, eu lia minha vida. Nunca mais fui a mesma”, disse ela certa vez.

Quando finalmente pôde comer algo, deu-se de cara com uma lata de leite condensado. Comeu tudo. Passou mal. O estômago desacostumara-se com a comida.

 

Após a guerra mudou-se para Amsterdã, iniciando um curso de teatro e balé, mas, desanimada neste último (foi-lhe dito que não tinha porte para a dança), seguiu para Londres onde iniciou uma tímida carreira de modelo. Sua mãe, antes considerada uma baronesa, tornara-se agora uma doméstica, e a filha se virava para ajudar nas despesas da casa.

Veio uma oportunidade em um filme intitulado “Nederlands in 7 lessen”, holandês, no papel de uma aeromoça. Pouca coisa. Vieram alguns musicais no teatro e trabalhos extras. Em “One Wild Oat” ela interpretou uma recepcionista de hotel, seguido de outros papéis pequenos e (finalmente) um papel onde teria um nome!! Em Young Wives’ Tale” sua personagem chamava-se Eve Lester. Grande começo. Sua primeira protagonista não veio nas telas, e sim no teatro. Aceitou participar dos testes para Gigi, incentivada pela própria autora, Colette. Passou.

Tornaram-se amigas por toda a vida. Foram 219 apresentações, e o seu primeiro prêmio: o Theatre World Award, de 1952. Em 1958 a peça viraria filme, sob a direção de Vincent Minelli. Foi cogitada para o papel no cinema, mas Leslie Caron acabou levando. As portas do cinema finalmente pareciam querer se abrir para ela. De vez. Veio “Secret People”, no papel de uma bailarina e um convite para estrelar seu primeiro papel na América: a princesa de “A Princesa e o Plebeu” (Roman Holiday), desbancando Elizabeth Taylor do papel principal. William Wyler se encantou com Audrey, com seu charme e inocência. “Era perfeita!”, disse. Gregory Peck faria seu par, e enquanto seu nome aparecia em letras garrafais, o de Audrey aparecia discretamente abaixo. Gregory Peck não gostou. Exigiu que o nome dela aparecesse ao seu lado. Conseguiu. Ela acabou faturando um Oscar por seu papel. Tornou-se mais uma celebridade americana.

Vieram enxurradas de convites, enquanto ela terminava sua turnê com Gigi. Foi ter com o estilista Hubert de Givenchy, que pensando se tratar de Katharine Hepburn, a recebeu alegremente. Decepção ao ver a delicadeza ao invés da energia de Katharine. Mas Audrey e Givenchy logo se tornariam sinônimos de elegância. Ele a vestiu em filmes como Sabrina e futuramente Bonequinha de Luxo. Sabrina resultou em um romance para Audrey. Com William Holden. Era casado, e ela nutria sonhos de casamento e filhos. Dizem que o motivo do término foi este: ele já tinha os seus. Ela queria os dela. Enfim, nada feito.
Mel Ferrer a esperava numa festa na casa de Gregory Peck. Casaram-se. Ela seguiria sua carreira no teatro, ganhando um Tony pela peça Ondine. Ganhava no mesmo ano um Oscar e um Tony. Tornou-se ícone da moda e da elegância. Êxtase.

Tornou-se requisitada. Vieram “Guerra e Paz” (1956), “Cinderela em Paris” (1957) e “Um Amor na Tarde” (1957). Estava grávida durante as filmagens de “O Passado não Perdoa”, mas ao cair de um cavalo acabou perdendo o bebê. Um ano mais tarde, em 1960 nascia seu primeiro filho: Sean Hepburn Ferrer, hoje seu representante legal. Seu próximo filme seria uma luta: Bonequinha de Luxo.

Truman Capote havia feito o papel pensando na loira sensual Marilyn Monroe. Mandaram-lhe a elegante Audrey. Ela no papel de uma garota de programa? Não. Ele não concordou. E fez questão de demonstrá-lo durante todas as cenas em que acompanhou. Nunca aprovou a escolha. Holly Golightly ironicamente se tornou o seu papel mais conhecido. Dois anos depois a atriz cantaria para o presidente John Kennedy em sua festa de aniversário. A última dele. Escolheram Audrey para aplacar a apresentação bombástica realizada por Marilyn Monroe no ano anterior. Hoje quase ninguém se recorda disto.

Vários atores mais velhos foram colocados como seus co-protagonistas, mas Cary Grant só topou fazer “Charada” se fosse mudado o roteiro. Ele previa que Cary a seduzisse, mas ele, sentindo-se velho para a garota, exigiu que fosse ele o seduzido.

Minha Bela Dama Veio a grande polêmica de sua carreira sob o nome de Eliza Doolittle, da peça “Minha Bela Dama”. Julie Andrews estreou na Broadway, com enorme sucesso o papel da florista pobre e mal educada, mas não fora aprovada para o elenco no filme. Era desconhecida demais do público para estrelar um filme tão esperado. Audrey aceitou o desafio e fez aulas de canto. Mas sua surpresa foi enorme ao ver o filme já realizado e sua voz dublada por Marni Nixon. Ficou indignada, saiu dos estúdios triste, mas desculpou-se por sua atitude no dia seguinte. My Fair Lady teria muitas indicações ao Oscar e nenhum em referência a Audrey. O amargor seria pior, pois Julie Andrews, a rejeitada, ganharia neste mesmo ano por “Mary Poppins”.

Mais papéis de destaque em “Como roubar um milhão de dólares” (1966) e “Um Clarão nas Trevas” (1967). Ela precisava de um tempo. O casamento com Mel Ferrer estava em crise e ela entrou em depressão. Decidiu abandonar temporariamente os filmes. Separou-se de seu marido em 1968. Não demorou muito para conhecer seu segundo marido, Andrea Dotti, um psiquiatra (bem conveniente). Com ele teve seu segundo filho, Luca Dotti. Audrey dedicava-se aos filhos e à pintura, sua nova paixão.

Após alguns anos recusando propostas e roteiros, finalmente ela retornaria às telas em 1976 em Robin e Marian, com Sean Connery. Não era mais uma mocinha, tinha já 46 anos e o filme foi um fiasco nas telas. Em “A Herdeira” (1979) a personagem foi envelhecida para melhor se adequar a atriz. Mais fracasso. E novo divórcio devido às freqüentes traições do marido. Robert Wolders seria seu último companheiro. Nunca se casaram. Mas se davam bem. Era o que importava.

“Além da Eternidade” (1989), de Steven Spielberg marcou sua despedida das telas. Sua personagem era um anjo. Relembrando fatos de sua vida, decidiu ajudar outros. Dedicou-se a UNICEF, saindo em campo para missões na Etiópia, onde visitava e cuidava das crianças que, como ela, sabiam a dor de passar fome. Fez campanhas em prol da vacinação e do abastecimento de água e comida. Viajou o mundo. Encontrou-se com vários líderes. Não se intimidava nem se negava a abraçar uma criança, estivesse ela limpa ou cheia de moscas.

Dores no abdômen indicavam que algo não ia bem com a eterna bonequinha de luxo. Após exames foi diagnosticado câncer. Estava se espalhando. Uma cirurgia foi feita, depois várias sessões de quimioterapia. O tempo não estava ao seu lado. O câncer se espalhou rapidamente. Calou-se no dia 20 de janeiro de 1993. No mundo o presidente Bill Clinton tomava posse pela primeira vez. Givenchy chorava sua maior representante, e moonriver tocava suavemente nos ouvidos de quem a amava.

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