Uma das coisas que mais me entristeceu nos últimos anos foi o fim da Revista Set, que tratava especificamente sobre filmes. Eu era daquelas que esperava todo início do mês para ter o meu exemplar garantido. Depois do fim, foram poucas as publicações que me chamaram a atenção. Depois, a ampla gama de informações trazidas rapidamente pela internet fez com que eu perdesse um pouco o hábito de ter em mãos um texto escrito. Mas confesso que isso me faz falta.
Foi com um imenso prazer que eu recebi a notícia que existe a Revista Hatari, publicada pela Editora Estronho. No formato de livreto, ela traz alguns dossiês temáticos. Estou aqui em mãos com o Dossiê TEEN MOVIES, que traz vários textos de diversos autores sobre o tema. Verginia Grando me fez reviver bons momentos de minha própria infância, ao relatar no seu, como conheceu o cinema de John Hughes:
“Assisti Clube dos Cinco pela primeira vez através da janela da casa de uma amiga de infância. Ela era uma japonesa, mais velha que a maior parte da turma (enquanto a maioria tinha nove ou dez anos ela já tinha uns quinze). (…) O mundo nunca mais foi o mesmo, pelo menos não para mim. Muito do que escrevo hoje tem um pé fincado no universo desse diretor e nos seus personagens com os quais ainda me deparo vez ou outra quando me olho no espelho.”
E era bem assim mesmo. A década de 80 carrega essa face nostálgica pela dificuldade que tínhamos em conseguir chegar a algo. Conseguir um filme ou uma trilha sonora era equivalente a um prêmio na loteria algumas vezes, e comemorávamos copiosamente. Conseguir tudo com um clique é maravilhoso, mas talvez futuramente, não deixe esse sentimento de felicidade que nós sentíamos antes.
Seguindo na mesma linha, Eduardo Savella faz uma análise sobre os temas mais presentes nos filmes oitentistas adolescentes. A angústia do crescimento e o medo do que está por vir, aquela felicidade que antecede uma grande queda, a fantasia que permeia os sonhos adolescentes e o medo da solidão.
Robert Bresson, um dos maiores cineastas franceses, também é relembrado no texto de Alexandre Magno. Percebi algo a mais sobre o diretor que eu nunca tinha visto sob esse viés, por não me atentar:
“Sendo o cinema de Bresson essencialmente objetivado a expressões da alma e sendo para ele as almas jovens as mais flexíveis e misteriosas, nada mais apropriado que sejam essas as escolhidas por ele para encarnar as dores do mundo hostil onde o motivo para acreditar na graça está justamente na sua ausência em tudo o que os cerca.”
A grande surpresa para mim, no entanto, foi ver um texto sobre Alberto Cavalcanti, diretor brasileiro excessivamente esquecido pela mídia brasileira. Para vocês terem ideia, sua obra chegou a ser considerado pelos ingleses como mais influente para eles do que a fase inglesa de Alfred Hitchcock. Cavalcanti ajudou a fundar a Vera Cruz, e uma junção de falta de sorte com cabeças retrógradas fez com que o diretor que fez filmes na França e Inglaterra, não se alinhasse com o Brasil. Precisamos falar um pouco mais sobre esse grande realizador, e é o que Felipe Ribeiro nos traz com seu artigo “A Realidade Musical de Alberto Cavalcanti”:
“Quando começamos a ouvir seu nome, temos a impressão de uma sombra, um fantasma que vagou por diferentes cinemas, um nome escondido na historiografia oficial do cinema. com o tempo, percebe-se a profundidade deste cineasta, e como sua presença sempre foi clara e forte para aqueles que influenciou. Alberto Cavalcanti, um cineasta errante, mudou a história do cinema francês, britânico e brasileiro, no mínimo.”
Hatari também traz alguns textos sobre Tobe Hooper e notas sobre o som de O Massacre da Serra Elétrica (escrito pelo professor Rodrigo Carreiro).
O projeto gráfico assinado por Marcelo Amado chama a atenção pelo desprendimento. Sentimos falta de cores, já que é todo em preto e branco, mas entendemos perfeitamente a dificuldade que é lançar esse tipo de ação em cores, saindo imensamente mais caro. Um problema muito, muito pequeno perto das vantagens de aprender um pouco mais sobre filmes que passamos sem nos atentar a determinados detalhes, ou conhecer novas possibilidades e assistir a tantos outros. Uma ótima pedida.
SERVIÇO
Revista: HATARI! 2: DOSSIÊ TEEN MOVIES + MINI DOSSIÊ TOBE HOOPER
Autores: Diversos
Páginas: 113
Para adquirir: Diretamente com a Editora Estronho