Em entrevista, Giulietta Masina revelava que não pensava que iria vencer na carreira

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Em 1959, em sua edição de número 295,  o Diário de Pernambuco exibia uma entrevista com a atriz italiana Giuletta Masina.  O cineasta Fernando Spencer assinava a sessão dedicada ao cinema. Reproduzimos aqui seu conteúdo (mantendo a grafia):

Em sua casa de Roma, rua Arquimedes, 141, temos marcada uma entrevista com Giuletta Masina, a genial atriz italiana lançada à fama internacional com A Estrada, seu primeiro filme estrelar, sob direção de Federico Fellini, seu marido. Giuletta mora no oitavo andar de um edifício moderno, e a saleta onde nos recebe é um gabinete de trabalho que a atriz divide com Federico. Em uma escrivaninha, a esquerda, está o Oscar que testemunha o êxito universal de Fellini e Giulietta em A Estrada, e em Noites de Cabiria.

Em toda a estante, livros e mais livros. Existe também um relógio grande e um toca-discos, e junto a ele, <long-play> de Ela Fitzgerald. Giuletta gosta da música clássica e do ballet, porém também gosta do jazz e do cha-cha-chá.

Giuletta aparece. Estende-nos a mão com um sorriso cordial:

– Aviso que não falo espanhol. Só italiano e francês – disse-nos na esperança de manter uma conversa misturada de duas línguas românticas. Whisky e soda, foram servidos para dar calor a conversa.

– Contente com seus êxitos ?
– Muito.
– Esperava-os?
– Não… Antes de trabalhar no cinema, estive no teatro e rádio porém não julgava dar certo no cinema. Foi Federico quem me animou. A ele tenho que agradecer esses triunfos. Ele foi o meu descobridor.
– Você prefere o drama ou a comédia?
– Nunca me conformaria com um gênero só. Se vou dizer na verdade o que prefiro, é toda obra que encerre um grande fundo de humanidade e de realismo. Existe em A Estrada, em As Noites de Cabíria e em meu último filme, Fortunella.

Depois de seus dois primeiros triunfos, Federico Fellini escreveu para ela – em companhia de Flajano e Pinelli – um argumento com moldes de Cinderela, porém uma <cinderela> que não encontra o príncipe de seus sonhos, como o da lenda.

QUEM É FORTUNELLA

Afastando-se do teatro, cenário repetido de seus mais recentes êxitos, Eduardo de Fillippo, tomou a direção da produção Dino de Laurentis, na qual Giuletta ia atuar junto a Alberto Sordi, Paul Douglas e Aldo Silvani. A versatilidade e talento de Giuletta Masina se impuseram na nova película, onde ela caracteriza Fortunella, uma jovem que pensa ser filha dos amores de um príncipe com sua empregada, para descobrir, no final de toda a classe de vicissitudes, que o aristocrática encontrava-se na Índia durante o tempo em que sua mãe serviu no palacio.
– Pelo visto, você prefere o patético.
Confirma com o olhar e um leve movimento com a cabeça.
– Por detrás de cada sorriso existe sempre uma lágrima – setencia.

COMO COMEÇOU

Giuletta aspirava uma profissão liberal quando matriculou-se na Universade de Roma, onde graduou-se em Filosofia e Letras e em Arqueologia Cristão.
– E como começou a atuar?
– Com efeito, comecei a atuar com o quadro de comédias da Universidade. Primeiro, fiz teatro. Certa vez tive que atuar em 30 teatros, um atrás do outro… Diretores de rádio me viram, e contrataram-me. Foi quando conheci Federico.
– Conte-nos.

Giuletta ruboriza-se ligeiramente. A figurinha miuda, loura, rosada, de olhos claros, expressa-se com decisão, porém com modéstia.
– Conheci Federico porque eu era a intérprete de uma série que ele escrevia para o rádio, Cico e Pallina. Primeiro apresentou-se pelo telefone… isto é, chamando-me ao telefone. Encontramo-nos… e bom, casamo-nos.

FELLINI E SUA FÉ

Isto foi em 1943. Seus quinze anos de matrimônio tem transcorrido suavemente. Ele viu nela possibilidades para o cinema. E ainda que escrevesse argumentos e dirigisse filmes, não queria impor. Ela atuou em papeis pequenos. Foi premiada como atriz secundária. Federico via nela uma veia de atriz de raro talento. E lhe confiou Gelsomina de A Estrada. Foi como um clamor universal. A essa consagração sucederam As Noites de Cabíria e Fortunella.

 

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