Outro dia eu estava estudando sobre o “screwball”, um subgênero surgido no final dos anos 20 e que era tudo o que o público no período da Grande Depressão precisava, com milhares de famílias desestruturadas e falidas. Ao chegar em casa após mais um dia de trabalho, esse público só queria rir, fazendo com que filmes que ampliassem a sensação de escapismo fizessem sucessos estrondosos. Os programas de rádio, repletos de notícias alarmantes, guardava um momento em que transmitiam algumas novelas com diálogos rápidos e ações malucas e o cinema logo viu um nicho para novos sucessos.
A loucura toda começa quando, chocada pelo interesse da adolescente pelo homem mais velho, Margaret decide usar psicologia inversa e pedir a Richard que finja interesse em sua irmã mais nova. O homem aceita o pedido e daí para frente o que vemos é uma série de confusões e situações que causam certa vergonha alheia aos adultos, mas que dão imensa satisfação à Susan. Susan é daquelas adolescentes que se acham evoluídas, sonhando em encontrar seu grande amor na figura de um homem mais velho, e que aparentemente não enxergam sua imensa fragilidade e realidade pueris.
É curioso que Cary Grant tenha aceitado esse papel, já que ele tinha verdadeiro pavor de interpretar homens de meia idade com interesses em garotas mais novas. A prova disso foram as futuras rejeições de papéis em que as damas eram dez ou vinte anos mais jovens que ele. Audrey Hepburn teve que se conformar com Gary Cooper (três anos mais velho que Cary) em Love in the Afternoon (1957), mas o ator não conseguiu escapar dela quando foi escalado em Charade (1963).
Só que, extremamente profissional e sabendo de seus limites, Cary colocou uma condição: só atuaria ao lado de Audrey se a personagem dela o seduzisse e não o contrário. Talvez a justificativa aqui em O Solteirão Cobiçado tenha sido a clara ênfase no ridículo da situação, já que além de ser uma adolescente mimada, era a Shirley Temple, reconhecida por sua carreira como atriz mirim.
Falando em Shirley, ela vivia já aquele drama comum em atores infantis: a dura passagem para a idade adulta. Acostumada com os bicos e gracinhas que ficam bem em uma criança, sentia realmente dificuldades em agir como uma pessoa mais velha, sobretudo porque raramente lhe ofereceram essa oportunidade. Pouco tempo depois preferiu se aposentar das telas e seguir uma carreira diplomática, embora eu acredite que ela seria capaz de seguir nas artes.
A terceira pessoa do trio principal é a sempre competente Myrna Loy, rainha dos filmes das décadas de 30 e 40 e que fez fama ao lado de William Powell nas séries The Thin Man. Saltando perfeitamente dos dramas para as comédias, surge com uma Margaret, uma mulher extremamente consciente, profissional, mas que não consegue resistir aos romances, tão típicos de garotas mais jovens. E ela e Cary Grant formam uma dupla com intensa química. Tanto que um ano após o lançamento de O Solteirão Cobiçado, já dividiam a cena no divertidíssimo Lar, meu tormento (1948). Sua Margaret se torna uma personagem carismática justamente por não cair naquele esteriótipo visto em muitos filmes desse período, e que mostravam boas profissionais como mulheres ou carentes ou mal humoradas.O Solteirão Cobiçado tem seu charme e cenas de destaque como as que Cary Grant age como um adolescente, chegando a ganhar um troféu (de mentira) em um campeonato. Esse ator se sobressaía em cenas que puxavam seu lado comediante, e creio que poucos atores tinham esse tato para o cinismo que ele tinha.