“Paul Krantz e Günther Scheller vêm por meio deste, descrever os eventos, para que não haja nenhum mal entendido. Esta noite nos vingaremos… Vingaremos daqueles que amamos e que traíram o nosso amor. E então nós, Günther e eu, deixaremos esta vida com um sorriso. Essa é toda a verdade.”
Quando inicia-se o filme, a primeira coisa que vemos é Paul subir as escadas, e o som crescente de sua respiração denotar o pânico que sente. O déjà vu se manifestou e lembrei-me de uma cena do filme Salvador, protagonizado pelo mesmo Daniel Brühl, em que ele caminha, com o mesmo olhar penoso, para a morte. Desta vez é diferente. Paul é um sobrevivente, e conta a história dos acontecimentos do final de semana, aparentemente tranqüilo, que resultou na morte de dois jovens. Ele acompanhara seu amigo Günther à sua casa, onde acabou conhecendo a irmã deste, Hilde.
Romântico, Paul acaba por se apaixonar platonicamente pela bela jovem. Nem tudo parece tão calmo como aparenta, na verdade Günther e Hilde, irmãos, dividem o mesmo homem. Günther incentiva a irmã a flertar e ficar com Paul, numa última esperança de que sua irmã por ele se apaixone e deixe o caminho aberto para ele e Hans (seu ex-amante e agora amante de Hilde). Hilde seduz Paul, pois faz parte de sua natureza a sedução, para mais tarde desiludi-lo: para ela o amor não existe e, se existe, deve ser vivido momentaneamente. Para Günther, existem apenas dois tipos de pessoas: as que nasceram para amar, como ele e Paul, e os que nasceram para ser amados, como Hilde e Hans.
Durante uma festa, ao ser preterido por Hans, Günther planeja o assassinato do ex-amante e o seu próprio. Percebemos desde sempre que a palavra é mediadora, mas o gestual terá força predominante no filme. A festa transcorreu com muita loucura, bebidas, drogas, música. Paul afasta-se com Elli (que nutre por ele a mesma paixão que ele possui por Hilde).
Ele retorna ao grupo pela manhã e encontra todos os envolvidos sentados na grama, cansados e ainda inebriados com o que passaram. Hilde lança-lhe um olhar de desafio e reprovação, Günther, sangrando por fora e por dentro, derrama algumas lágrimas e sangue, e Hans, o causador de toda a tristeza dos irmãos, sorri cinicamente. É o bastante para que Paul se dê conta de que ele magoara seu amigo, e parte para cima dele, despejando todo o desespero de todos ali presentes. Apesar do texto poético, não precisamos deles para perceber as diferenças e as igualdades daqueles jovens em busca do amor.
Para Que Serve o Amor Só em Pensamentos? foi a estréia de Achim von Borries na direção. A história é baseada de um fato verídico, ocorrido em Berlim, no final da década de 20, mas ao invés de seguir fielmente o contexto em que ocorreu o diretor acaba por desenvolver sua narrativa de forma atemporal, utilizando a trilha sonora sem grandes efeitos sofisticados. Esta surge em alguns momentos para situar a época abordada (década de 20) e também para situar o silêncio que permeia todo o ambiente, evocando sempre que algo terrível está para acontecer. Como as palavras, o som também parece surgir só nos momentos necessários, quando a imagem não mais possa transmitir sua mensagem.
Parece não ter sido por acaso, que um roteiro tão pesado como este, fosse fotografado com a luz sempre direta, e as cores predominantes fossem, em ordem, o branco, o verde e o amarelo. O verde aparece nos tons das roupas de Hilde, na natureza que norteia a casa onde eles se juntam e até mesmo na bebida (Absinto), o amarelo forma o contraste, em tons dourados dos ambientes. O branco é o reflexo que surge pelas janelas quando estão em ambientes fechados, na forte iluminação dos rostos e nas roupas, quase sempre claras, quase sempre brancas. Nas cenas dos tribunais, o negro predomina, como forma de luto, mas no pescoço de Hilde há um lenço branco criando um ponto, mostrando-se presente.
Quanto aos atores, as interpretações impressionam, levando-se em conta a intensidade passada em alguns momentos apenas pelo olhar. Daniel Brühl domina o filme, mas é a performance de August Diehl, ator ainda com pouca experiência, que nos atrai. Ele consegue transmitir todo o sofrimento e desesperança causados pela depressão e o desespero causado pela rejeição do amante.
Se a pergunta título do filme, “Para que serve o amor só em pensamentos?” fosse feita aos personagens, teríamos as respostas prontas. Tão somente para sofrer. Bem ou mal, sempre para sofrer. Enquanto uns são amados, belos porém maus, outros nasceram para a dor de serem desprezados e excluídos, para servirem de pano de fundo para que outros vivam intensamente suas paixões, distantes do amor real. Esses demônios do amor não nos largam durante um bom período, depois que assistimos a este filme.Pra Que Serve o Amor Só em Pensamentos?