Peter Lorre, o ator que Hollywood Engoliu

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Sempre achei Peter Lorre um ator subestimado. Talvez porque o primeiro contato que tive com ele foi através do expressionista M – O vampiro de Düsseldorf, de Fritz Lang. Nele, Lorre interpreta o personagem principal, que em nada tem a ver com um vampiro, mas com psicopata, assassino de crianças. Sua participação foi vital importância para chamasse a atenção dos norte-americanos. Chegaremos lá. Antes, vamos conhecer um pouco sua história.

László Löwenstein nasceu em 26 de junho de 1904 em Rosenberg, na Hungria. Seus pais eram judeus e tinham outros dois filhos. Sua mãe faleceu quando o pequeno tinha apenas quatro anos. Seu pai não demorou muito e logo se casou, para a tristeza dos filhos. Pelos relatos, ela não teria sido uma boa madrasta. Por volta de 1913 a família se mudou para Viena, e nesse período, seu pai também faleceu.

Já em Viena, Lorre passou a frequentar alguns teatros locais. Logo entrou em uma companhia de teatro. Aos 17 anos começava a se apresentar em alguns deles, mudando-se constantemente para várias cidades.  Seu nome foi inspirado no herói Struwwelpeter, que, como Lorre, tinha olhos expressivos. Finalmente, já na década de 20 partiu para Berlim, sendo elogiado por seu trabalho.

Peter nos palcos, na peça Mann ist Mann, de Brecht

Seu nome logo chegou aos ouvidos de Fritz Lang, que o chamou para participar de M (1931). Ele não tinha mesmo dúvidas que tinha em mãos um ator capaz de trazer todas as nuances de um personagem tão forte quanto o assassino solitário Hans Beckert.  Ele não se enganou, pois  Lorre, aos 27 anos, deu a sua melhor interpretação. Apenas veja esses olhos, que retratam toda a dubiedade de um homem que não deseja, mas não resiste ao desejo de matar:

A chegada dos nazistas mexeu profundamente com a vida de todos. Em 1933 Lorre partiu inicialmente para a França, mas pouco tempo depois, entrou em contato com Alfred Hitchcock. O ator não sabia falar uma palavra em inglês, mas conseguiu um dos papéis principais em The Man Who Knew Too Much (1934) decorando as frases foneticamente.

Peter Lorre em The Man Who Knew Too Much (1934)

Peter trabalharia mais uma vez sob a direção do mestre do suspense em Agente Secreto (1936). Após o grande destaque, Lorre partiu para a América com um convite e a mala cheia de sonhos. Inicialmente encontrou um terreno fértil.  Seu primeiro filme na América foi Dr. Gogol – O Médico Louco (Mad Love, 1935), de Karl Freund.

O filme foi proibido em alguns países na época devido às cenas fortes da cirurgia. A versão que assisti tinha 60 minutos de duração, mas cerca de 20 minutos foram cortados e perdidos na época do lançamento. Mad Love conta ainda com o Colin Clive (Frankenstein) como o pianista. Ele e o Lorre fizeram amizade nesse filme, e o ator iria no funeral do Clive dois anos depois. Em seguida, Lorre participaria da versão de Crime e Castigo (1935). Entre 1937 e 1938 ele se tornaria o Mr. Moto em uma série de filmes de detetives.  E então, sua carreira como astro principal findaria.

Em Crime e Castigo

Em 1941 Lorre trabalhou ao lado de Humphrey Bogart em Relíquia Macabra. O ator americano e sua esposa Lauren Bacall se tornariam grandes amigos de Lorre, assim como Conrad Veidt, que viria para a América com sua ajuda. Peter assinara um contrato com a Warner Brothers e faria uma série de filmes conhecidos.

Relíquia Macabra (The Maltese Falcon) (1941)
Casablanca, ao lado de Bogart
Esse Mundo é um Hospício (1944), com Cary Grant

Os anos 50 trouxe poucos trabalhos significativos – É quase cruel vê-lo dançar em Meias de seda. Nesse período ele emprestava sua voz para programas de rádio e posteriormente para a tv. Mas uma junção de bebida, cigarro, sensação de fracasso e dívidas fariam sua vida um grande inferno. Peter Lorre, como já dizia o poeta Fernando Pessoa, não vivia: durava.

Bogart e Peter com Catharine

Conta-se que, apesar de tudo, ele tinha um senso de humor incrível, embora algumas vezes pudesse parecer um pouco ácido. Não se sabe se essa é uma história real ou boato, mas há mesmo uma história sobre sua presença no funeral de Bela Lugosi. Lorre teria confidenciado a seu amigo Vincent Price: “Você não acha que devemos enterrar uma estaca em seu coração?”.

Bela Lugosi, Peter Lorre & Boris Karloff

A década de 60 trouxe um destaque para filmes de terror. O ator, assim como Boris Karloff, Vincent Price e Basil Rahbone, passaram a participar de alguns filmes voltados ao gênero. Estes se tornaram cults e bastante apreciados por um público específico. Hoje em dia é facílimo de encontra-los, já que foram lançados em dvd. Sua última atuação foi no terror  The Raven, lançado em 1963 e que Jack Nicholson e Vincent Price.

The Raven (1963)

Peter casou-se três vezes ao longo de sua vida. Com Celia Lovsky (1934 – 1945), Kaaren Verne (1945 0 1950) e Anne Marie Brenning (1953 – 1964).  Abaixo, uma foto do ator com a esposa Anne e sua única filha, Catharine.

Seu casamento com Anne terminou em 1962, e o divórcio foi finalizado em 1964. O ator morava sozinho em sua casa quando foi encontrado morto em 23 de março de 1964 após sofrer um acidente vascular cerebral. Parecia ter bem mais do que seus 60 anos. Seu corpo foi cremado e suas cinzas depositadas no Hollywood Forever Cemetery. Permanece como um exemplo de como Hollywood pode ser cruel para talentos tão gigantescos, e condescendente com pessoas que também não o merecem.

O ator se ressentia do fato de atuar como um ator secundário em filmes que traziam atores que não tinham o mesmo talento que ele. E nem sempre conseguia segurar essa barra. Tal fato não era novo em Hollywood. A indústria do cinema americano engoliu muitos talentos, escolhendo aqueles que transformariam em grandes heróis. A outros, como Peter, restava a frustração de pequenas participações em papéis estereotipados. O ator que foi reconhecido por Chaplin como um dos maiores de todos os tempos, padecera.

 

Fontes: Theguardian, Critica RetrôCinemararitiesRevista Cinemateca Brasileira, Thenostalgialeague

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