Flores do Pó (1941)

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“Esta é a história de uma grande mulher, e do grande trabalho que está a fazer para a humanidade. O nome dela é Edna Gladney, e ela vive em Fort Worth, Texas. Dedicamos este filme a ela. “

Assim abre-se Flores do Pó (Blossoms in the Dust), sinalizando que o drama dirigido por Mervyn LeRoy traia cargas de emoção embaladas por uma trilha sonora intermitente. Douglas Sirk provavelmente aprovaria tal dramaticidade necessária. A britânica Greer Garson especializaria-se em mulheres fortes e relevantemente importantes para seu tempo. Ela seria Madame Curie, Susie Parkington e Eleanor Roosevelt em outras produções. Aqui ela interpreta Edna Gladney, uma das maiores humanistas de todos os tempos. Esse foi o primeiro filme em Technicolor de LeRoy, recebendo quatro indicações ao Oscar, levando apenas um, dedicado a Melhor Direção de Arte.
Flores do Pó inicia-se com os preparativos para o casamento de Edna com um jovem chamado Damon. Passando no Banco, antes da festa de noivado, ela conhece Sam (Walter Pidgeon). A antipatia se transforma em amor após os dois trocarem cartas apaixonadas durante um tempo. Sua irmã de criação também está apaixonada, e prepara-se para o casamento em conjunto. Mas a família do noivo rejeita a situação, pois Charlotte (Marsha Hunt) foi adotada, e portanto, ilegítima. A garota, tomada de desespero, acaba tirando a própria vida.
Passa-se o tempo e vemos Edna em plena felicidade, comemorando cada um dos anos de casamento. Devido às dificuldades no parto, ela não poderá mais engravidar. Alguns anos se passam em extrema felicidade, interrompida após a morte do pequeno filho. É aí que começa a missão dela, que cuidará de crianças sem lar, até que estas consigam um local adequado onde recuperem a autoestima, com amor e educação. Com o tempo, a nossa heroína percebe que não basta apenas serem adotadas, as crianças devem ter o reconhecimento de que são cidadãs como qualquer um.
Primeiramente é preciso que se diga que o filme em grande parte é ficcional, e a própria Edna chegou a achar estranha a mudança dada em sua própria história. Hollywood sempre pediu licenças poéticas para mudar vidas, achando que dando uma maior carga de dramaticidade, elas pareceriam mais motivacionais. Uma camada de verniz e muitas cenas em que os retratados são vítimas de dissabores são constantemente adicionadas como um tempero a mais na rotina que eles julgam comum demais.
Não seria o caso da história da sra. Edna. Sua história de vida foi muito forte. No filme há Charlotte, uma irmã adotiva, mas a real Edna não teve essa irmã. Esse não teria sido o fato que a despertou para o problema da ilegitimidade. Li algumas fontes de que a humanista seria ela própria uma filha ilegítima, tendo apenas uma irmã que nasceu do segundo casamento de sua mãe. Tal fato influenciaria profundamente sua alma em busca de reconhecimento das crianças que foram vítimas, assim como ela. No entanto, em outros relatos, não se fala que ela não teria conhecido o pai, mas que teria perdido ele ainda na primeira infância. Eu teria que ler uma biografia que toque nesse assunto mais profundamente. Há o livro Texas Adoption Activist Edna Gladney, de SherrieS Mcleroy, infelizmente sem tradução para o português.
A verdadeira Edna
Com relação ao filho que ela teria tido, fato mostrado no filme, mais dúvidas. Há registros sobre uma gravidez quase fatal tubária, mas o site da instituição que ela ajudou a fundar cita que ela não teve de fato filhos. Outra curiosidade é que o pequeno Tony, garotinho por quem Edna (Greer) se afeiçoa a ponto de pensar em adota-lo, foi feito por uma menininha chamada Pat Barker. O Pat era de Patricia. Tal criança também não existiu, mas teria servido de exemplo para os percalços que a mulher passaria na vida, e sobre a dificuldade de dizer não para a maternidade em detrimento de tantas outras crianças. É algo que hoje soa um tanto estranho, já que pensei em boa parte do tempo que não haveria impedimentos dela se dedicar ao pequeno e à instituição ao mesmo tempo.
De qualquer maneira, tirando essas diferenças, Edna ficou lisonjeada por ser interpretada por uma atriz tão bela quanto Greer e gostava de ser lembrada pela imagem dela, pois se achava gordinha. Mas como era bela, e que coração tinha! Cuidando inicialmente de crianças cujas mães precisavam trabalhar, ela criou uma creche gratuita que era financiada por empresas locais. Em 1935 ela conseguiu fazer com que o Texas se tronasse o primeiro Estado a remover o estigma da ilegitimidade dos registros de nascimentos. Em 1951, dez anos após o lançamento do filme, ela fez com que fosse aprovada uma lei que garantia às crianças adotadas os mesmos direitos à herança, antes destinados apenas às crianças biológicas.
A menininha que interpretou um menino no filme, Pat Barker
Essa mulher tão importante colocou no lar mais de dez mil crianças abandonadas, revolucionando as práticas de adoção. Edna ajudou a criar uma Casa das Crianças e a Aid Society em Fort Worth, se juntando ao conselho de administração em 1910. A Aid Society se tornaria “Gladney Center for Adoption”, em homenagem ao 25º aniversário dela como superintendente. Ela permaneceria como superintendente da instituição até 1959, quando sua saúde debilitada a obrigou a se afastar. Dois anos depois, viria a falecer dois anos depois.
Nem é preciso dizer que Greer Garson, como usualmente, dá sua alma à interpretação. Desde a juventude com certa frivolidade até a idade mais avançada e suas convicções, ela consegue manter o ritmo ditado por LeRoy. Quando ela repete o slogan muitas vezes utilizado pela verdadeira Edna “Não existem filhos ilegítimos, somente os pais ilegítimos.” acreditamos profundamente nas suas palavras. Está ali uma mãe de tantos filhos, e que em nome do amor, precisa lutar por um futuro melhor para cada um deles.


Apesar das mudanças significativas da vida de Edna, no geral Flores do Pó tem um caráter positivo. A MGM pagou a Edna US $ 5.000 pelos direitos de sua história. Tal valor foi empregado em sua instituição. A publicidade gerada pelo filme foi extremamente positiva, fazendo com que outros milhares de pais buscassem crianças em sua instituição, desfazendo mitos e ajudando a abrir a mentes de alguns que ainda se alinhavam com os pensamentos ultrapassados de legitimidade.
Fontes:
http://adoptionsbygladney.com/

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