Escolhi falar sobre esse filme hoje por ele trazer um tema extremamente moderno para a década de 30. Amemos outra vez (Next Time We Live, 1936) fala sobre um casal que se ama muito, mas que não estão dispostos a abrirem mão de seus sonhos. Muitos entendiam (e ainda entendem) que para os relacionamentos darem certo é necessário abrir-se mão de desejos particulares. Só que geralmente sabemos quem abre mão deles. E é justamente sobre nenhum dos dois estar disposto a se sacrificar que trata esse filme.
No elenco, James Stewart e Margaret Sullavan, no primeiro dos trabalhos que fariam juntos. E foi a atriz, que naquele período gozava já de uma boa fama quem indicou o jovem e inexperiente ator que a partir daí se tornaria uma espécie de ícone americano. O diretor Edward H. Griffith acertou em cheio em escolhe-lo para o papel de Christopher, um jovem jornalista que está disposto a tudo a crescer em sua carreira.
O que torna essa história baseada no romance homônimo de Ursula Parrott, como já adiantei acima, é a fuga do lugar comum naquele período. Naquelas décadas, e até hoje, se formos um pouco pessimistas, era não só comum mais totalmente incentivado que o matrimônio ocupasse todos os sonhos de uma garota. Ela podia estudar, mas tudo quanto aprendesse deveria ser usado no lar que formaria, na educação dos filhos que teria, no amor que dispensaria ao seu tão almejado marido. Contrariando tudo isso, Cicely Hunt amaria profundamente Christopher, um amor que por vezes doía, mas ela também só se sentiria completa se se tornasse uma grande atriz.
Suas vitórias no campo profissional são tão comemoradas quanto a chegada de seu amado. Nos momentos chave, ela sempre contará com a presença constante de Tommy Abbott (um belo Ray Milland em início de carreira), o melhor amigo de Christopher que também se torna seu acalento nos momentos de solidão. Mas aos poucos, desfrutar da presença do marido vai se tornando algo raro, tão raro que ver-se já não se torna algo essencial. O amor vai se perdendo nas ausências, a presença deixa de ser especial. A vida, as vitórias, os caminhos começam a se separar. Eles começam a ser felizes separados. Uma visão pessimista sobre o casamento? Talvez.
Parece mesmo difícil conciliar o amor e o sucesso na carreira de uma mulher. Tudo poderia ser resolvido, aos moldes do início do século XX se ela abrisse mão de seus sonhos. Mas estaria ela sendo sincera consigo mesmo e com Christopher? O título em português, Amemos outra vez pode dar uma resposta sobre o fim do casal que teve tudo menos falta de amor em seu caminho.
Amemos Outra Vez fala sobre escolhas, sobre como a modernidade mexeu não só no ponto de vista tecnológico ou em outras formas mais efetivas, mas também com os relacionamentos. É uma visão certamente pessimista, mas que pelo menos nao carrega o ranço visto em outros filmes sobre o assunto. Ele traz brechas para o diálogo sobre o assunto e para nós, num século seguinte, possamos pensar o quanto estamos dispostos a abrir mão de nós mesmos, dos nossos sonhos em prol dos outros. Estariam estes também dispostos a isso? Só de abrir a possibilidade de reflexão, já considero esse um grande filme.