Scarface (1983)

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Tony Montana  (Al Pacino) chega aos Estados Unidos como um exilado de Cuba. Capitalista, não concorda em não ter uma vida de dinheiro.  Fora da prisão, depois de um motim, entra para o submundo das drogas. É o início de sua ascensão. Ele não se contenta com pouco, quer todo o dinheiro que lhe seja possível, os carros, as casas, os luxos, a mulher bela de seu chefe. E consegue. Como um Midas que em tudo que toca faz em ouro transformar.

Scarface é a refilmagem de um clássico com o mesmo nome, de Howard Hawks, de 1932, e tem na direção o sempre polêmico Brian de Palma e roteiro de Oliver Stone. Giorgio Moroder assina a trilha sonora que mostra a tensão logo em seus primeiros toques, lembrando claramente o tema de Psicose. O que, aliás, não é grande surpresa, haja vista que o diretor é apontado como um seguidor do mestre do suspense Alfred Hithcock.

A primeira coisa que chama a atenção neste filme é a extravagância de cores fortes, quentes, que acabam mentalmente nos levando instintivamente à violência que está por vir. Se nós pudéssemos dar uma cor ao filme, esta seria vermelha. Vermelho sangue. Os cortes rápidos de sequencia acontecem  sobretudo nas cenas de violência intensa. Mas os planos longos que seguem logo após algum embate são carregados de tensão extremas, causando a angústia da espera ou do resultado. O diretor parece brincar conosco e nos dizer: não respirem!!

Algo como uma lesma loura surge na pele da então novata Michele Pfeiffer. Elvira é mais um objeto de desejo que logo após ser conquistado, é deixado de lado. Segundo Frank Lopez (Robert Loggia), o tipo de mulher que passa metade do dia botando a roupa e a outra metade tirando. Segundo Montana, um útero tão contaminado pela cocaína que é impossível de fazer brotar o que seja dentro dele.

Tony Montana talvez não seja um vilão no sentido exato da palavra. Não em um filme tão tenso como este, em que se correlacionam vidas que, afinal, parecem apenas preocuparem-se consigo mesmas. Todos carregam a sua carga dramática de maldades  e suas penas pagar por suas escolhas. E a forma como Tony é conduzido faz-nos pensar em alguém que faz a sua própria justiça e possui seus próprios códigos de ética, aqui retratados pela obsessão quase incestuosa pela irmã Gina (Mary Elizabeth Mastrantonio) e a negação em matar crianças.

Quem faz parte do jogo está lá para jogar, e ele parece entender isso perfeitamente. Com os agendes federais lhe investigando, o casamento arruinado e o vício pela cocaína aumentando, nada mais parece ter sentido. Ele afundara-se num mundo de pó, literal e parabolicamente falando. Só faltaria algo para terminar o único elo de realidade que ele teria: a traição de seu melhor amigo. E isto ocorreu quando ele se casou com sua irmã. Scarface tem mais de 30 anos e continua atual com suas cores tão escuras e tons tão trágicos quando o foi quando foi em 1983.

No filme há uma cena interessante e que me levou imediatamente a uma outra bastante parecida, em “East of Eden”, de Elia Kazan. Lá o filho, interpretado por James Dean, junta dinheiro para dar ao pai no dia do seu aniversario. Ele o rejeita, dizendo que prefere que o filho lhe dê o presente de ser um homem honrado. O filho magoado sai de casa chorando enquanto sua cunhada corre para lhe consolar.

Em Scarface, Tony, já um homem rico, volta à casa da mãe e também oferece-lhe dinheiro, fruto do seu  trabalho. Para a irmã, oferece tudo o que o dinheiro pode dar. Sua mãe enerva-se e o coloca para fora de casa dizendo que não é digno o dinheiro que ele lhe traz. Sua irmã corre ao seu encontro e o aceita, fato que faz com que entre em contato com o submundo em que seu irmão vive e que sua mãe temia. As correlações com o filme de Kazan terminam por aqui. Pois Tony, até então um Midas, sem que se aperceba começa a ver ruir seu castelo que teve como alicerce sangue e carne humanas. E a ver se transformar em pó tudo aquilo que considerava ouro.

 

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