O Garoto (1921)

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Uma mulher sai do hospital após dar à luz ao seu filho. Solteira, carrega o filho e o fardo de ser apontada por todos. Não tem condições de sustentar a si ou a ele. Em transe, ainda consegue andar até um bairro rico e deixa-lo em um carro, na esperança que seja adotado por uma família abastada. Por azar, o carro é roubado, e o garoto abandonado num cortiço. Andando em uma ponte, a mulher finalmente parece despertar do transe em que estava, e corre em busca de seu filho. Descobre o que acontecera. Entra em desespero. Final do primeiro ato. Parecemos estar diante de um drama.

O vagabundo caminha solitário em uma rua. Colhe um ou outro cigarro do chão quando encontra um bebê. É o suficiente para que surjam momentos cômicos enquanto ele desconfia que a criança tenha caído de algum dos apartamentos ou tenta devolvê-lo a uma mulher que já leva outra criança. Sem ter como se livrar do pequeno, leva-o para casa, e dando-lhe o nome de John, resolve cria-lo. Estamos diante de uma comédia.

Dura é a vida que os espera. Onde cabe um cabem dois. Mal, mas cabem. Jackie, o garoto, cresce assim em péssimas condições financeiras, mas cercado pelo amor de um pai pobre, luta para sobreviver. É um terreno fértil para vê-los em meio a venturas e desventuras. Os meios, claro, justificam os fins. E os dois trabalham numa parceria de quebrar vidros que eles mesmos consertam. Parecemos estar em uma comédia té o momento em que entra em ação o poder público que abandonou a mãe, o filho e a figura do pobre vagabundo. Ele surge para separar o pai e o filho. Estamos mais uma vez diante de um drama.

Jackie Coogan parece ter nascido para ser o garoto. Chaplin vivia dias de angústia. Tendo perdido o primeiro filho que nascera morto e passando por uma crise em seu primeiro casamento, o cineasta estava totalmente sem ideias para um novo filme. Ele foi ver uma apresentação no teatro e  como falei nesta matéria, ao ver o dueto de Jackie e seu pai, Chaplin não se deu conta de que poderiam trabalhar juntos. Foi somente quando soube que um ator chamado Jackie Coogan havia sido contratado que nasceu a vontade de fazer um filme do encontro do vagabundo com o garoto. Indo ao encontro do pai, descobriu que na verdade o homem , que tinha o mesmo nome, é que havia sido contratado.

Jackie era um dos mais talentosos atores mirins de sua época. E deixava-se dirigir melhor do que qualquer adulto, segundo o próprio Chaplin. Bastava algumas apresentações para que o garoto reproduzisse com fidelidade alguns números de dança. A dupla que encantou multidões, também se deu bem durante todo o processo de filmagens.

E se O Garoto serviu para lançar ao estrelato o pequeno ator, também serviu como despedida de Chaplin de sua garota Edna Purviance. No papel da mãe, ela enveredava por um papel dramático que poucas vezes teve chance de executar enquanto atriz. O filme seguinte, Casamento ou Luxo? (1923) ele iria dirigi-la e lança-la como uma atriz dramática. Infelizmente, sua carreira não teria o sucesso almejado e ela acabou sendo lembrada mais pelo tempo em que atuou ao lado do pequeno vagabundo. Os filme chaplinianos mostram sempre elementos biográficos, e tanto o personagem garoto quanto a mãe com certeza trazem traços do pequeno Chaplin e sua mãe, separados pela pobreza e loucura.

A cena do reencontro entre o vagabundo e o seu filho encontra-se entre as mais belas, senão a mais bela do cinema. A música composta por Chaplin, engrandece o momento. Vamos revê-la:

A riqueza deste que considero o maior dos filmes Chaplinianos está justamente nessa dualidade: magistralmente, ele equilibra a dor e a comédia em iguais possibilidades de enredo, sem deixa-lo piegas. Desconheço algum cineasta que tenha chegado a esse nível, antes ou depois. Que tal rever O Garoto mais uma vez?

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